18/04/2011

Meu tempos de Nietzsche

Dia desses, organizando minha biblioteca, bati os olhos num livro de Nietzsche (aquele da capa verde) e, sem ter como fugir, revisitei meus tempos de jovem revolucionário, cheio de boas intenções. Recuperei, na frágil memória, desejos e planos para um país melhor, com mais esperanças e todas aquelas coisas que a gente pensa poder mudar quando se tem o futuro inteiro pela frente e ainda não temos impregnados na alma (e nas costas) as marcas de uma repressão violenta e sem sentido.

Com Nietzsche aprendemos a sabotar a lógica da filosofia dominante, fomos anarquistas do pensamento e, de quebra, cults. Da mesma patota, fomos “coleguinhas” de Marcuse, Engels, Marx, Hesse e outros criadores de caso que moldaram nosso jeito de ser e nos encorajaram a enfrentar a PM.

Era um tempo em que sonhar era direito de todos, não morávamos em apartamentos ou casas, mas em aparelhos. Qualquer de nós, acompanhado por mais dois, era visto como uma ameaçadora conspiração contra o país. Vivíamos, literalmente, nas sombras e atalhos da vida. Nosso caminho era marginal por excelência.

Depois a coisa ficou preta.

Muitos de nós morreram ou desapareceram (nome técnico dado para pessoas mortas em nome da Segurança Nacional). Alguns recomeçaram suas vidas no exílio, muitos ficaram grisalhos longe de suas famílias, outros cederam ao status quo, e todos, absolutamente todos, carregaram suas dores e frustrações pelo resto da vida.

Hoje, sentado atrás de uma indesejável barriga capitalista (que de capitalista mesmo só tem a barriga), volto a uma das máximas do velho Friedrich para entender a lembrança: “Na solidão, o solitário se devora. Na multidão, devoram-no. Pode escolher”. Triste sina dos pensadores. Consola-me uma de suas outras máximas, que só mesmo minha teimosia para manter viva: ”A arte deve antes de tudo, e em primeiro lugar, embelezar a vida”.

Ao escrever, acredito estar fazendo arte. Menos mal.

Anderson Fabiano


Imagem: Google