Sei que não sou muito diferente da maioria dos brasileiros, ou seja,
deixo tudo pra última hora: a declaração do imposto de renda, a compra da carne
na manhã do dia do churrasco, acordar às dez da matina, em plena alta temporada
e reclamar quando não encontro espaço na praia. E não haveria de ser diferente
com o pedido de aposentadoria. Nem sabia onde procurar os documentos
necessários.
Após a enésima mudança de regra do jogo (e uns bons puxões de orelha da
mulher amada) consegui, finalmente, encurralar o governo e conquistei o direito
à tão sonhada aposentadoria.
É bem verdade que mesmo havendo sido dirigente de uma das mais poderosas
multinacionais do mundo, diretor da maior financeira independente do país, dono
de algumas empresas e até secretário municipal, só me restava a alternativa da
aposentadoria por idade, já que tive que me submeter a alguns subempregos, sem
contribuir para o INSS, pra não deixar a família morrer de fome.
Tudo bem! Completei os tais 65 e dei entrada no meu pedido de
aposentadoria dois dias depois. Dois dias depois... E é claro que faltavam os
malditos comprovantes!
Engraçado... O dinheiro é seu, você é você (sem nenhuma sombra de
dúvidas), todas as suas contribuições foram (ou deveriam ter sido) devidamente
registradas, mas você tem que comprovar tudo, senão...
Fila, senha, espera e lá está você sentado como um reles pedinte diante
do atencioso funcionário que demonstra passo a passo como você fez tudo errado
na vida e após umas duas horas de INSS, sem direito nem a um cigarrinho, sai o
resultado: seu processo é registrado, mas “com exigências”.
Você corre, fala com um, com outro e só consegue comprovar uma das duas
exigências, amparado na reprodução da folha do Diário Oficial. A outra,
esquece. A prefeitura para qual você trabalhou está nas mãos do partido
adversário e você precisa viajar 1.800 km (hoje moro num outro estado), dar
entrada num processo, pagar uma taxa e aguardar pelo menos três meses para obter
uma resposta que, curiosamente, está disponível em qualquer computador da
secretaria de Administração. E todo esse esforço só para aumentar alguns pilas
na sua aposentadoria. Esquece!
Apresento os documentos uns poucos dias depois e ouço da atendente: “É,
acho que eles aceitarão a folha do DO...” Putz! Nem funcionário público está
acreditando no DO! (?)
E vem a espera... um mês, dois... e nada!
A consulta no próprio órgão não funciona: preciso tentar o 135. O 135 me
manda de volta pro órgão. O órgão diz que não há registros mas que o benefício
já deveria ter sido concedido.
Peraí! BENEFÍCIO? CONCEDIDO? Ou esses caras não sabem falar português ou
estão de sacanagem comigo! Até onde o Aurélio ou o Michaelis me amparam,
benefício é favor, graça, serviço gratuito e conceder é dar, outorgar,
facultar, permitir e eu não estou precisando de graça ou favor porra nenhuma!
Estou apenas tentando receber de volta uma grana preta que fui forçado a
entregar ao governo durante quase quarenta anos e que me foi prometido, seria
devolvido quando eu parasse de trabalhar, coisa que ninguém consegue num país
injusto como o nosso.
Se somarmos todo dinheiro que entreguei compulsoriamente a esse bando de
incompetentes para “tomar conta”, deveria estar milionário agora. Benefício é o
cacete!
Mas, nessa terra brasilis onde um partido, dito dos trabalhadores, trata
trabalhador e bosta da mesma maneira, um número de telefone (135) que não
informa nada com coisa nenhuma e ainda recebe o nome de Portal do Cidadão, tudo
pode acontecer.
Mas, registre-se: Benefício
é o cacete! Só quero minha grana de volta!
Anderson Fabiano
Anderson Fabiano