18/05/2012

Comissão Nacional da Verdade

Escrevi há uns anos atrás, que o Brasil era o país do talvez. Talvez isso, talvez aquilo. E sempre me martelou a cabeça (e a alma) aquela frase, erroneamente atribuída ao De Gaulle, no episódio da Guerra das Lagostas: O Brasil não é um país sério. Pois bem, abro o jornal na quarta-feira e leio, em júbilo, que o nosso governo criou a Comissão Nacional da Verdade e pensei: Pronto! Não seremos mais o país do talvez. Seremos, finalmente, o país da Mentira ou da Verdade. E isso é bem melhor, afinal, mais vale a certeza do não que a incerteza do sim.

Mergulho na notícia e fico sabendo que serão investigadas todas as violações de direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988. Inclusive as dos Anos 60?! Maravilha! Valeu a pena esperar!

Mas minha precipitada euforia sofre as inevitáveis decepções: a Comissão tem direito de convocar vitimas e acusados, mas “os convocados podem se recusar a prestar depoimentos”... Após dois anos, a Comissão se obriga a publicar um relatório, mas “os resultados poderão ser de conhecimento público ou enviados apenas para o presidente ou ministro da Defesa”. (gulp!) E a melhor de todas as pérolas: a Comissão da Verdade “não terá poder de punir ou recomendar que acusados de violar direitos humanos sejam punidos”. Ué!? Então ela vai fazer exatamente o quê?

De imediato, minhas costas ardem na lembrança das borrachadas, meu rosto ferve ao som dos tapas e socos e tudo por que era contra o acordo MEC-USAID, a americanização de nossa cultura e pedia uma solução para o problema dos excedentes... Sinto gosto de sangue na boca.

Senhores membros da Comissão, o país só aguarda duas respostas: Onde estão os nossos filhos e irmãos e quem deu sumiço neles. Pois, não existem “desaparecidos”. Até onde se saiba, o Brasil nunca foi atacado por esquadrilhas de UFOs. Logo, ninguém foi abduzido. Se não podem responder a essas perguntas, perdoem esse velho criador de caso, mas voltem logo pra casa, pois essa comissão não passa de uma palhaçada!

Então, ninguém vai pedir desculpas a um pai e confessar, humildemente, que o corpo de seu filho está eternizado num dos pilares da ponte Rio-Niterói? Ou, que alguns peixes fisgados por aí se alimentaram de seus restos, lançados de um helicóptero ou navio? Ninguém será responsabilizado pelo estupro de sua filha? Ou pela bomba da ABI, ou da OAB? Ou pelo menos, pela queda do avião do Castelo Branco ou pelo “enforcamento” do Vlado?

...

Não vou esperar dois anos, vou ligar agora mesmo para a pizzaria. Mas, vou pedir uma de Talvez, por que a de Verdade, já sei, anda em falta.

Anderson Fabiano

Imagem: Google

11 comentários:

Anônimo disse...

Pois é, meu caro cronista, dou-lhe toda a razão! A comissão da verdade quer oficializar a mentira, ou parte da verdade (que também é uma mentira), para poder jogar estas questões no arquivo morto e não temer mais as sombras. Saiu uma lei sobre publicidade de documentos públicos (o óbvio ululante - se são públicos têm de ser acessíveis ao público!). A Dilma mandou cumprir (espero que seja para valer); já o Legislativo e o Judiciário parecem estar confabulando se vão cumprir a lei. Sabes o quanto gosto de história - e o mundo infelizmente ainda não é tão diferente daqui - a 2a Guerra acabou faz 67 anos e ainda existem documentos que não podem ser acessados... Por quê? É, esse "faz de conta"... Grande abraço! Roberto Curt Dopheide

Dante Marcucci disse...

Caro Fabiano,

Temos opiniões diferentes sobre algumas coisas. Quanto à inutilidade desta comissão, concordo contigo!
Por outro lado, caso a verdade fosse mesmo resgatada, acho que deveriam investigar tambem os crimes do "outro lado", dos bandidos que saquearam, mataram, raptaram, roubaram bancos em nome de uma falsa democracia que eles não queriam: Na verdade, queriam uma ditadura como a que vigora até hoje em Cuba.

Deveria tambem ser revelada a verdade sobre o que fazem hoje esses guardiões da democracia que estão acabando com nossa dignidade e com o respeito aos cofres públicos.

Eu sinto falta dos tempos em que a corrupção, a roubalheira, as ligações dos politicos com o crime, a baderna e o crime organizado eram combatidos por um estado forte.

Da minha parte, nunca me faltou liberdade para ser honesto e trabalhador.

Saudações

Dante

Jorge Sader Filho disse...

Justíssima bronca, Fabiano.
Tem mais. Não se pode confiar numa "Comissão Verdade" nomeada pelo governo. O fato faz parte da História do Brasil, os membros deveriam ser historiadores, talvez com a participação de um jurista indicado pela OAB.
Do jeito que foi feita, é parcial e discricionária.
Você é um homem ponderado, e conseguiram que ficasse irritado.
É o que eles querem...

Meu grande abraço,
Jorge

chica disse...

Incrível,não é?

E Pode pedir pizza tamanho família pois agora mesmo mais algumas estão saindo de lá.

Quando a esmola é demais,temos que desconfiar,né? Linda crônica! Pena tão verdadeira! abração,lindo fds por aí pra vocês,chica

Maria Helena Sleutjes disse...

Anderson, o que mais me aflige neste país de grandes pilantras é não saber o que está por tras deste pastelão. O passado não pode ser recuperado nem redimido a não através da educação, da emancipação da cidadania, do exercício da ética por parte de governantes e governados. Esta questão é igualzinha a questão das ridículas cotas nas universidades. Me parece que a coisa acontece assim: vamos dourar a pílula e enfeitar o pavão, mas no que é essencial e básico para a evolução de nossa sociedade, vamos ficar quietinhos e com ações acanhadas como sempre.
Parabéns por levantar esta boa polêmica!!! Abraços.

Anônimo disse...

Tristeza absoluta...
e com as lágrimas da Presidente do País tb!!
O que será que pessoas desse quilate, devem realmente sentir ao anunciar essa palhaçada?? O choro... pq foi??
Sei, pq presenciei ainda pequena esse sofrimento, de quem luta e só recebe pauladas... então Comissão dos Direitos Humanos, qual a verdade da sua emoção??? Dá para responder? Não, né?!
Bom poetinha, reserva uma pizza pra mim tb!! É o que como há 52 anos! O meu gastro é que fica feliz com uma cliente de carteirinha!!
Bjo grande e parabéns pelo o texto que nos faz refletir.

Tyrone disse...

Pois é meu amigo. Àquela época andava preocupado com as delícias da vida e não percebia a gravidade e a virulência do que acontecia. Entretanto,soube mais tarde que fui alvo de questionamento profissional na Empresa em que trabalhava e monitorado por quase um ano pois não era concebível (na ideia deles)que a mesma pessoa frequentasse salões de sinuca e bancos de Universidade. Não morri, senão seria mais um inocente a ser dibitado nessa conta macabra.

Jorge Sader Filho disse...

Embora já tenha falado neste espaço, volto para dizer que eu e Anderson temos ideias muito semelhantes.

Anônimo disse...

Fabiano,

quero lhe dar parabéns pela análise muito perspicaz e extremamente articulada sobre a atual conjuntura do nosso país.
De Goulle realmente tinha razão quando disse que o Brasil
não era um país sério. E é triste constatar que até a Academia de Letras entra no rol da politicagem barata nivelando por baixo o nosso
Grande Machado de Assis, do qual me orgulho de ser meu patrono no Cenáculo Fluminense de História e Letras.
Fico perplexa com a politicagem barata que invade todos os seguimentos de nossos contextos governamentais.

Beth do Valle

Allan Robert P. J. disse...

Creio que esse tipo de autoritarismo seja uma prerrogativa dos países latinos. Digo, esse eutoritarismo virulento que os do poder usaram por anos para manter o poder. Na Itália a coisa não foi muito diferente, mas a técnica mudou: hoje os instrumentos são econômicos com resultados igualmente devastantes. Comissões servem apenas para retaliações aos inimigos, dali ninguém se salva. Excelente análise!

[Aqui como aí, as pizzas podem ser muito indigestas.]

Gaivotadourada22 disse...

Fabiano...

Concordo plenamente com você!!!
Não fossem tão doloridas essas feridas, a única reação seria uma ampla gargalhada...
Também já vou encomendar a Pizza, e tamanho família!!!
Grande abraço para você e para minha Amiga do Coração!!!